Efeitos da pandemia nas relações contratuais – Portal Ponto X

Efeitos da pandemia nas relações contratuais

A situação financeira de muitos cidadãos e empresas encontra-se drasticamente afetada pela disseminação da Covid-19. Comércios fechados, desemprego, recessão, são notícias que vivenciamos dia após dia. Os diversos entraves ao comércio, à movimentação e reunião de pessoas, têm impactado diretamente as atividades empresariais no país. E, com isso, surge o questionamento: como ficam as relações contratuais? A resposta depende dos efeitos causados pela pandemia em uma determinada relação contratual.

Os impactos econômicos e sociais da pandemia já começam a ser levados aos Tribunais por meio de ações judiciais de revisão e rescisão de contratos, alicerçados nas disposições legais do nosso Código Civil e de novas normas especiais.

Na revisão de contratos há que se analisar cada setor de forma diferente, dando tratamento desigual aos desiguais.

Veja-se que a obrigatoriedade e força vinculante dos contratos, o ‘pacta sunt servanda’, deve ser avaliado sob a ótica do cumprimento da função social do contrato, visando a obtenção de um equilíbrio das prestações para ambas as partes, visto que deve imperar sempre a boa-fé objetiva.

O surpreendente cenário que vivemos hoje realça, mais do que nunca, a importância dos princípios da probidade e da boa-fé contratual consagrados no art. 422 do Código Civil. É com base nestes princípios que prováveis ajustes contratuais estarão por vir para garantir a continuidade das relações comerciais e obrigacionais, não importa o segmento empresarial, se público ou privado.

A situação atual cria uma espécie de “solidariedade contratual”, que exige cooperação entre as partes, alcançando, assim, a probidade e boa-fé estatuídas pelo Código Civil, objetivando tutelar a dignidade e garantias constitucionais dos contratantes.

A pandemia do coronavírus evidentemente se enquadra como um caso fortuito ou força maior apto a gerar um possível inadimplemento das mais diversas obrigações e contratos por parte do contratante e também do contratado. O Código Civil prevê que, nessas hipóteses, o devedor não responde pelos prejuízos resultantes do cumprimento diferenciado ou descumprimento da obrigação, caso comprove que tais fatos geraram prejuízos ou dificuldades para cumprir com seus deveres. Com efeito, a pandemia configura “fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”, nos exatos termos do parágrafo único do art. 393 do Código Civil.

Outros autores entendem que a função social do contrato acabou tendo uma importância grande ao explicitar a importância da eficácia externa dos contratos, não a vinculatividade do contrato entre as partes, mas perante terceiros, sobretudo no que diz respeito à ordem pública. Nesse sentido, por exemplo, contratos de longa duração, que não são paritários, com partes assimétricas, que tem avaliações de risco diferentes. Nesses casos talvez se pudesse falar da eficácia externa, da função social dos contratos, que permitisse algum tipo de intervenção do Judiciário.

Assim, vivenciando uma situação de dificuldade criada por caso fortuito ou força maior, a primeira providência é avisar a outra parte sobre o desequilíbrio contratual e consequente onerosidade excessiva.

O Novo Código Civil acolhe a teoria da imprevisão, que permite a revisão ou resolução de um contrato por onerosidade excessiva. Ao passo que o Código de Defesa do Consumidor acolhe a teoria alemã, da base objetiva dos contratos. De todo modo, o objetivo principal de ambas as normas é garantir segurança jurídica aos contratantes.

Portanto, situações subjetivas, vivenciadas por cada indivíduo em particular, podem servir de base a uma pretensão de revisão contratual, que, de igual forma, gera segurança jurídica e garante a manutenção dos contratos, adequando-os, assim, à nova realidade.

A função social do contrato foi trazida por Miguel Reale a partir de estudos de Emílio Betti, autor do Código Civil italiano. Autores minoritários defendem que seria um eco da teoria da causa no ordenamento brasileiro, que Clóvis Bevilacqua recusou e que maioria da doutrina entende que não foi acolhida no direito brasileiro como elemento obrigatório do contrato.


Por: Fonseca, Rosal & Pinheiro – Advogados

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